O Balanço da Lei 11.445 de 2007 e os desafios impostos à sociedade e trabalhadores e trabalhadoras Urbanitários (as)

Dia 05 de janeiro de 2017 fez 10 anos da edição da Lei 11.445 de 2007. Sem dúvida, um passo importante no desenvolvimento do saneamento básico no Brasil. Mas, antes de falar propriamente da Lei 11.445 de 2001 é importante resgatar uma série de iniciativas que proporcionaram ao saneamento o protagonismo que este tem que ter em relação às políticas públicas. A primeira iniciativa, que merece destaque, foi à criação do Ministério das Cidades, no ano de 2003, antiga demanda dos movimentos que defendem a reforma urbana. Essa ação deu “endereço” para o saneamento básico, para a mobilidade urbana e para a habitação. Também foram criadas secretarias nacionais das três áreas, bem como, a constituição do Conselho Nacional das Cidades e dos Comitês Técnicos que objetivavam tratar dessas questões.

Neste período iniciou-se um processo de descontingenciamento de recursos para o saneamento básico, e em seguida a criação do PAC 1 e 2, que significou um importante aporte de recursos a empresas, estados e municípios, como forma de ampliar os níveis de cobertura de saneamento.

Nunca é demais lembrar que a luta, realizada por vários agentes sociais, foi intensa para a  aprovação da Lei 11.445/2007, afinal, estava em jogo era acabar com o que se convencionou chamar de vazio institucional do setor, que desde o fim do PLANASA,  em meados dos anos 1980, marcavam o saneamento básico no Brasil. Destaque-se que essa iniciativa tinha sido frustrada quando o Presidente FHC vetou na íntegra, em 1995, o PL 199 que estabelecia regras para o setor.

Em nossa opinião alguns destaques merecem ser ressaltados na lei:
A ampliação do conceito de Saneamento Básico, incorporando o manejo dos resíduos sólidos e das águas pluviais;
A necessidade de instrumentos de regulação;
A exigência planejamento e a definição do município como responsável pela elaboração dos planos;
A possibilidade de controle social sobre a prestação dos serviços.

É importante destacar que a Lei não é a Lei dos sonhos de todos os seguimentos que atuam no saneamento, mas é fruto do consenso possível construído de forma democrática.

Também não podemos deixar de falar do Plansab, Plano Nacional de Saneamento Básico que significa um importante marco na retomada das discussões do saneamento Os investimentos estimados para o período de 2014 – 2030, são de R$ 508,4 bilhões e a implementação do Plano requer grande pressão social.

Mas nem tudo são flores. Apesar desses avanços os desafios para que alcancemos a universalização do acesso aos serviços são gigantescos, sobretudo no que se relaciona a coleta e tratamento de esgoto principalmente nas regiões norte e nordeste do Brasil.

Desafios:
Os desafios, passados 10 anos da Lei 11.445/20017, são muitos:
Reforçar a unidade, a mobilização e organização social para enfrentar os retrocessos que o governo golpista de Michel Temer tenta impor às conquistas do setor de saneamento;
Agora mesmo, através do decreto nº 9.076, de 7 de junho de 2017, o governo esquartejou  decreto nº 5.790, de 25 de maio de 2006: que garantia uma gestão participativa e democrática do Conselho Nacional das Cidades.
Vejamos:
1) Revogou o inciso XVI do caput do art. 3º do decreto nº 5.790, que garantia a convocação e organização da Conferência Nacional das Cidades, pelo Conselho Nacional das Cidades.

2) Revogou o art. 15.  que afirmava que a Conferência Nacional das Cidades, prevista no Inciso III do art. 43 do Estatuto da Cidade, constitui um instrumento para garantia da gestão democrática, sobre assuntos referentes à promoção da Política Nacional de Desenvolvimento Urbano.

3) Revogou o art. 16.  que afirmava serem objetivos da Conferência Nacional das Cidades: I – promover a interlocução entre autoridades e gestores públicos dos três Entes Federados com os diversos segmentos da sociedade sobre assuntos relacionados à Política Nacional de Desenvolvimento Urbano; II – sensibilizar e mobilizar a sociedade brasileira para o estabelecimento de agendas, metas e planos de ação para enfrentar os problemas existentes nas cidades brasileiras; III – propiciar a participação popular de diversos segmentos da sociedade para a formulação de proposições, realização de avaliações sobre as formas de execução da Política Nacional de Desenvolvimento Urbano e suas áreas estratégicas; e IV – propiciar e estimular a organização de conferências das cidades como instrumento para garantia da gestão democrática das políticas de desenvolvimento urbano nas regiões, Estados, Distrito Federal e Municípios.

4) Revogou o art. 17.  Que definia as atribuições da Conferência Nacional das Cidades I – avaliar e propor diretrizes para a Política Nacional de Desenvolvimento Urbano; II – avaliar a aplicação do Estatuto da Cidade e demais atos normativos e legislação relacionadas ao desenvolvimento urbano; III – propor diretrizes para as relações institucionais do ConCidades e da Conferência Nacional das Cidades com os conselhos  e conferências de caráter regional, estadual e municipal; IV – avaliar a atuação e desempenho do ConCidades.

5) Revogou o art. 18.  A Conferência Nacional das Cidades deverá ser realizada a cada três anos. O decreto novo determina que a Conferência Nacional das Cidades acontecerá a cada quatro anos.

6) Revogou o Art. 19.  que afirma que compete à Conferência Nacional das Cidades eleger os membros titulares e respectivos suplentes do ConCidades indicados nos incisos II a VIII do art. 4º, que são: representantes do Poder Público Estadual, do Distrito Federal ou de entidades civis de representação do Poder Público Estadual e do Distrito Federal; representantes do Poder Público Municipal ou de entidades civis de representação do Poder Público Municipal; representantes de entidades dos movimentos populares; representantes de entidades empresariais; representantes de entidades de trabalhadores; seis representantes de entidades profissionais, acadêmicas e de pesquisa; e quatro representantes de organizações não governamentais, respeitada a representação estabelecida para os diversos segmentos.  Foi revogado também o § 1o do artigo 19: A eleição de que trata o caput será realizada durante a Conferência Nacional das Cidades, em assembleia de cada segmento convocada pelo Presidente do ConCidades especialmente para essa finalidade, e o § 2o  que dizia: Resolução do ConCidades disciplinará as normas e os procedimentos relativos à eleição de seus membros.

Os desafios colocados e os ataques governo Temer ao setor
Na verdade, em vez de usarmos nossas energias no impedimento de retrocessos, deveríamos estar debatendo quais os avanços o setor obteve concretamente a partir da Lei e quais são os entraves a serem superados? Como se dá a sustentabilidade dos serviços pelos operadores públicos após os investimentos na ampliação dos serviços? A Lei conseguiu ser de fato implementada? Se não, por quê? Qual tem sido o papel do Ministério Público no acompanhamento da aplicação da Lei? E o controle social? Quais as dificuldades na sua efetivação, sobretudo no âmbito local? E o papel de planejamento dos municípios? Por que poucos planos municipais de saneamento não foram elaborados, onde estão as dificuldades? O que poderia ser feito pelos governos estaduais e federal em apoio a elaboração dos planos?
Mas não é só isso, a mais forte investida do atual governo contra o saneamento diz respeito ao processo de incentivo à privatização desenvolvida pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social – BNDES, que foi escalado para financiar a contratação de consórcios privados para a modelagem de privatização para vários estados brasileiros, em particular para as suas companhias de saneamento, configurando-se numa verdadeira chantagem no processo de negociação das dívidas dos estados.

Um banco, que deveria ter a função de apoiar o desenvolvimento econômico e social, a melhora da gestão das empresas públicas, a ampliação dos níveis de atendimento dos serviços de saneamento, é utilizado para apoiar iniciativas que favorecem o setor privado, diga-se de passagem, utilizando para isso de recursos públicos.

Por isso tudo reforçamos a necessidade de impulsionamos esse debate com o conjunto da sociedade brasileira.

FAMA vai garantir um amplo debate sobre o setor de saneamento
Um momento importante acontece agora, no processo de organização do Fórum Alternativo Mundial da Água – FAMA que acontecerá em março de 2018 em Brasília e que nos possibilita realizar essa discussão com os mais variados agentes sociais. Afinal, a questão do abastecimento de água e do esgotamento sanitário esta associado à luta histórica por cidades melhores, inclusivas em que as pessoas tenham direito a vida digna e que o meio ambiente e a saúde sejam preservadas. Demos o start desse debate na “Plenária Nacional Urbanitária de Mobilização Sindical e Popular – Nenhum Direito a Menos”, os dias 8,9 e 10 de junho, onde centenas de trabalhadores da cidade e do campo demonstraram total disposição de luta e resistência aos ataques à classe trabalhadora brasileira.

Pedro Blois
Presidente da FNU

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