Empresa ligada a Padilha faturou R$ 13 milhões em contratos sob investigação
A empresa Explorer Call Center, com sede em Porto Alegre e ligada ao ministro da Casa Civil, Eliseu Padilha, recebeu R$ 13 milhões da estatal gaúcha Corsan (Companhia Riograndense de Saneamento) em contratos sob investigação. Entre os indícios de irregularidades encontrados por auditorias realizadas pelo TCE-RS (Tribunal de Contas do Estado do Rio Grande do Sul), estão o pagamento por serviços não prestados e uma “procrastinação” para a realização de nova licitação.
Por meio de sua assessoria de imprensa, Padilha disse que não iria se pronunciar sobre o caso. Procuradas, a Corsan e a Explorer não retornaram as ligações feitas pela reportagem. O TCE-RS, por sua vez, disse que já notificou os responsáveis pelas irregularidades e que aguarda o julgamento dos casos.
A Corsan é uma das maiores estatais do Rio Grande do Sul. Ela é responsável por fornecer água e esgoto a 6 milhões de pessoas em 316 municípios. Por ser estatal, a empresa precisa submeter suas contas à aprovação do TCE-RS. Segundo o tribunal, a avaliação das contas da companhia está atrasada desde 2010.
A Explorer Call Center foi aberta em setembro de 2009. Desde então, sua sede funciona em um prédio alugado que pertence à Gaivota Participações LTDA, empresa que tem Padilha e sua mulher, a advogada Simone Camargo, como sócios.
Um relatório da PF sobre a Operação Lava Jato mostrou mensagens de texto enviadas por Padilha para tentar captar negócios para a Explorer Call Center junto à operadora Oi em 2014, então controlada pela Andrade Gutierrez. Padilha admitiu sua atuação em favor da Explorer, mas negou qualquer irregularidade.
Ascensão
Apenas quatro meses depois de criada, em janeiro de 2010, a Explorer empresa venceu uma licitação e conseguiu seu primeiro grande contrato: fornecer o serviço de call center para a Corsan por dois anos ao custo de R$ 3,5 milhões.
Após o fim da vigência inicial, em vez de realizar uma nova licitação, a Corsan preferiu “aditivar” o contrato com a Explorer ano após ano.
O contrato, que deveria acabar em janeiro de 2012, foi estendido por mais quatro anos, terminando em janeiro de 2016, quando a companhia fez uma dispensa de licitação para contratar novamente a Explorer Call Center, desta vez por seis meses, prazo para que uma nova licitação fosse feita.
Uma nova licitação para o serviço foi feita em julho de 2016 e foi vencida pela Explorer Call Center. Documentos da Corsan obtidos pelo UOL mostram que ela foi a única empresa a participar da disputa.
Entre aditivos e dispensa de licitação, a Explorer recebeu R$ 13 milhões. A Lei de Licitações prevê que contratos de prestação de serviços como os de call center podem ser renovados por até 60 meses, mas a demora da Corsan em realizar um novo processo licitatório chamou a atenção dos auditores do TCE-RS.
“Procrastinação”
Em um relatório que consta do processo que analisa as contas da Corsan referentes a 2014, técnicos do TCE-RS classificam a demora da Corsan em fazer uma nova licitação como “procrastinação” e afirmam que a demora não foi justificada pela empresa.
Um trecho do documento obtido pelo UOL por meio da Lei de Acesso à Informação mostra que os técnicos avaliaram que a “Diretoria Colegiada da Corsan aprovou”, em dezembro de 2014, “a celebração de outro aditivo de prorrogação […] sem apresentar a justificativa exigida”. Os técnicos apontam ainda que “a Corsan não tomou as medidas necessárias para a realização de procedimento licitatório” durante o ano de 2014.
O advogado Alberto Rollo, especialista em direito administrativo, diz que os aditivos contratuais devem ser a exceção, não a regra. “O fim de um contrato de longa duração não é algo imprevisível. Desde o início, você sabe que o contrato vai terminar. Não tomar as providências para a realização de uma nova licitação pode trazer prejuízos para a empresa que contratou o serviço”, afirmou.
Serviços não prestados
Os auditores gaúchos também identificaram que a Explorer recebeu por serviços que não prestou entre 2010 e 2012. O problema ocorreu depois que a Corsan fez um aditivo para aumentar o número de posições de atendimento da Explorer no valor de R$ 898 mil.
A irregularidade, apontam os técnicos, é que o valor seria correspondente ao pagamento por 7,5 posições de atendimento, entretanto, não seria possível pagar por meia posição atendimento, uma vez que não seria plausível fracionar esse tipo de serviço. O prejuízo para os cofres públicos foi, segundo os técnicos, de R$ 654 mil.
Somente dois anos depois de começar a receber os recursos de forma irregular, a Explorer se comprometeu a ressarcir um valor estimado em R$ 654 mil para a Corsan.
Ligações com o ministro
Foi o próprio Padilha que admitiu que a Explorer Call Center funciona em um dos imóveis da Gaivota Participações. Em entrevista ao jornal “O Globo” em julho de 2016, o ministro afirmou que a empresa tem a sua sede em um de seus imóveis desde o final de 2009. Padilha disse que procurou o ex-presidente da Andrade Gutierrez Otávio Azevedo porque quanto mais posições de atendimento a Explorer tivesse, maior seria o valor do aluguel recebido por ele.
O fato de a Explorer Call Center funcionar em um prédio que pertence a uma das empresas de Eliseu Padilha não é o único elemento que liga a empresa ao ministro da Casa Civil. Um dos seus filhos, Robinson Eliseu Reck Padilha, é um dos principais advogados da Explorer Call Center em processos trabalhistas movidos contra a empresa.
Embora nas mensagens enviadas a Otávio Azevedo o então deputado federal Eliseu Padilha se posicionasse como dono da empresa, ele não aparece no quadro societário da Explorer segundo a Receita Federal.
No cadastro nacional de empresas da Receita Federal, a Explorer tem como sócios André Fraga de Carvalho e a empresa Discovery Consultoria, Administração e Vendas do Brasil LTDA, da qual André é o sócio-administrador.
Carvalho, no entanto, é sócio de pessoas muito próximas ao ministro como Elisiane da Silva. Ele e Elisiane são sócios da Vital Help, uma empresa que atua no ramo de saúde e se localiza no mesmo prédio em que funciona a Explorer Call Center. Elisiane, por sua vez, é sócia da mulher de Padilha, Simone Camargo em outra empresa, a Amanhecer Participações.
Elisiane também é diretora do programa de formação política da FUG (Fundação Ulysses Guimarães), entidade que foi presidida por Padilha até janeiro de 2015.
Outro lado
Desde a semana passada, a reportagem do UOL tentou obter posicionamentos sobre o caso do sócio-administrador da Explorer Call Center, André Carvalho de Fraga; da diretoria da Corsan; do TCE-RS; e do ministro Eliseu Padilha.
Por meio de sua assessoria de imprensa, Padilha disse que não iria se manifestar sobre o assunto. A Corsan e a Explorer Call Center não responderam às demandas enviadas pela reportagem até o fechamento desta reportagem.
O TCE-RS, por meio de sua assessoria de imprensa, disse que “diversas situações motivaram a reinstrução dos processos” da Corsan. Entre os motivos do atraso, estão a elaboração de relatórios de auditoria complementares que foram incluídos na avaliação das contas.
Questionado sobre que medidas concretas o tribunal tomou diante das irregularidades encontradas, o TCE disse que já solicitou esclarecimentos aos gestores envolvidos e que aguarda o final do julgamento dos casos.
“As medidas adotadas foram de análise do contrato e apontamento em relatórios de auditorias, dando ciência dos mesmos aos gestores do órgão e intimando-os a prestarem esclarecimentos. Após a análise dos esclarecimentos, o processo segue para parecer do Ministério Público de Contas e, então, para o Gabinete do Conselheiro Relator para elaboração de seu voto e inclusão do processo em pauta para julgamento”, disse o TCE-RS.